Já comentamos sobre o potencial neuroinvasivo do Covid-19, que está se fazendo presente em relatos de pacientes infectados, tanto nos casos graves quanto naqueles mais leves. Agora, dois novos sintomas têm chamado a atenção dos pesquisadores e da mídia: perda do olfato e do paladar pelo coronavírus.
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Como a perda do olfato e do paladar pelo coronavírus foi descoberta?
No início de março deste ano foi relatado o primeiro caso de infecção do cérebro (encefalite) pelo Covid-19, com confirmação do vírus por PCR no líquido cefalorraquidiano (LCR), um fluído corporal primariamente estéril que recobre o cérebro.
Em publicação de fevereiro de 2020, Ling Mao e colaboradores descreveram 78 pacientes de três centros hospitalares de Wuhan, China, que manifestaram sintomas neurológicos. Destes, 24,3% apresentavam acometimento do sistema nervoso periférico, incluindo anosmia (perda do olfato), ageusia (perda do paladar) e neuralgias (dores relacionadas aos nervos).
Tendo em vista que praticamente todas as informações sobre a pandemia são extremamente recentes (final de 2019 em diante), os estudos sobre perda do olfato e do paladar, bem como outros sintomas, normalmente ainda são pequenos e, alguns, sem sustentação científica.
Todavia, aqui, os sintomas supracitados parecem ser relevantes e podem levantar a suspeita de infecção pelo Covid-19 mesmo em pacientes com pouco ou nenhum outro sintoma, desde que excluídas outras causas mais frequentes, como rinite por exemplo. A grande diferença é que, tanto anosmia quanto a ageusia (perda do olfato e do paladar), parecem ser súbitas no caso do coronavírus!
Em 2006, Hwang relatou o caso de uma paciente com 27 anos, que desenvolveu a Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG ou SARS, do inglês), e apresentou anosmia súbita três semanas após o início dos primeiros sintomas. Essa anosmia persistiu por mais de dois anos.
O que dizem as entidades médicas?
No final de março de 2020, algumas entidades médicas internacionais, fundamentadas em observações de otorrinolaringologistas e infectologistas, alertaram para a ocorrência de anosmia, geralmente associada a ageusia (falta de paladar), mas sem obstrução nasal, em pacientes suspeitos ou confirmados de Covid-19. Os sintomas febre, tosse e dispneia podem se fazer presentes ou não. Ainda, esses especialistas foram aconselhados a não prescreverem corticoides por via oral ou tópica diante de paciente com quadro clínico de perda do olfato ou do paladar agudas! A Sociedade Britânica de Rinologia, por exemplo, acrescentou que desconhece se esse comprometimento é transitório ou definitivo.
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No Brasil, em 22 de março de 2020, foi emitida nota de orientação aos médicos otorrinolaringologistas em relação a Covid-19, pela Academia Brasileira de Rinologia (ABR) e a Associação Brasileira de Otorrinolaringologia e Cirurgia Cervico-Facial (ABORL-CCF) reiterando as recomendações acima.
Conclusão
Tudo isso mostra a importância de os pacientes, os médicos e os demais profissionais da área da saúde estarem atentos para a perda do olfato e do paladar pelo coronavírus. Somente a atenção a esses sintomas e o bom exame clínico poderão dar certeza da associação de anosmia e ageusia agudas com a infecção pelo Covid-19.
Não menos importante é descartar outras causas de anosmia e ageusia mais frequentes e, sempre que tiver dúvidas, converse com seu médico. Nesse caso, preferencialmente um neurologista ou otorrinolaringologista.
Referências bibliográficas:
- Ling Mao et al, 2020. Neurological Manifestations of Hospitalized Patients with COVID-19 in Wuhan, China: a retrospective case series study. https://doi.org/10.1101/2020.02.22.20026500.
- Li Y, Li Y, Bai W, et al. The neuroinvasive potential of SARS-CoV2 may be at least partially responsible for the respiratory failure of COVID-19 patients. 2:0-2. doi:10.1002/jmv.25728
- Hwang CS. Olfactory neuropathy in severe acute respiratory syndrome: report of A case. Acta Neurol Taiwan. 2006;15(1):26-28.
- Lüers JC, Klußmann JP, Guntinas-Lichius O. Die Covid-19-Pandemie und das HNO-Fachgebiet: Worauf kommt es aktuell an? [The Covid-19 pandemic and otolaryngology: What it comes down to?] [published online ahead of print, 2020 Mar 26]. Laryngorhinootologie. 2020;10.1055/a-1095-2344. doi:10.1055/a-1095-2344
- Lake MA. What we know so far: COVID-19 current clinical knowledge and research. Clin Med (Lond). 2020;20(2):124–127. doi:10.7861/clinmed.2019-coron
Dr. Matheus Trilico é neurologista referência no diagnóstico e acompanhamento de TEA e TDAH em adultos. Formado em medicina pela Faculdade Estadual de Medicina de Marília (FAMEMA) e com residência em Neurologia pelo Hospital de Clínicas da Universidade Federal do Paraná (HC-UFPR) e mestre também pela UFPR. Além de atuar como neurologista em consultório privado e no Sistema Único de Saúde (SUS), realiza também atividades acadêmicas. Dr. Matheus Trilico acredita que o ser humano precisa conhecer bem sua saúde e, por isso, transmite as informações sobre o quadro clínico de forma clara e didática, reafirmando seu compromisso com a exímia relação médico-paciente. Amante da tecnologia, busca utilizá-la para agregar conhecimento e facilitar a vida dos pacientes, mas sem perder seu foco: o humanismo e a qualidade do atendimento médico.
CRM 35.805/PR – RQE 24.818