Entender se o autismo é genético, hereditário ou dependente de fatores ambientais pode ser o caminho para compreendermos melhor essa condição e o aumento nos diagnósticos. Se você tem filhos, pais ou parentes diagnosticados com o Transtorno do Espectro do Autismo (TEA) e está lendo esse texto é porque deve ter notado semelhanças entre eles e, talvez, você. A ciência também percebeu essa particularidade e, por isso, vamos te explicar agora se o autismo é genético. Continue lendo!
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Contexto histórico
O TEA é um complexo transtorno do neurodesenvolvimento. Sua história na medicina é considerada recente, sendo inicialmente melhor descrito em 1943 pelo psiquiatra austríaco Leo Kanner que, enquanto estudava as psicoses infantis na Universidade Johns Hopkins, nos EUA, publicou o trabalho “Os distúrbios autísticos de contato afetivo” no qual apresentou uma nova entidade — o autismo infantil precoce.
Um ano depois, em outubro de 1944, o pediatra austríaco Hans Asperger apresentou sua tese de livre-docência. Nela estavam seus casos atendidos na Clínica Infantil da Universidade de Viena, constituindo o que ele chamou de “psicopatia autística infantil”.
Com o tempo, pesquisadores perceberam grandes semelhanças entre os pacientes de Kanner e Asperger, principalmente por suas dificuldades de comunicação e de interação social, que hoje fazem parte dos critérios para diagnóstico do transtorno. A psiquiatra Lorna Wing foi uma dessas pesquisadoras e responsável por renomear a “psicopatia autística infantil” como a Síndrome de Asperger, que ficou globalmente conhecida.
Como se pode perceber, desde os primórdios o autismo foi correlacionado às crianças, fazendo com que elas sejam o principal foco de atenção. Todavia, ao longo dos anos, o TEA sofreu várias reclassificações, deixando de ser uma condição exclusivamente infantil para também ser reconhecida na população adulta
Assim também, por se tratar de uma condição com um conjunto de sinais e sintomas extremamente variados, desde 2013 o autismo passou a ser melhor denominado como “Transtorno do Espectro do Autismo” (TEA). Em 2018, o TEA também ganhou uma nova codificação pela 11ª versão da Classificação Internacional de Doenças, a CID-11, sob o código 6A02.
Com tudo isso percebemos que, embora recente, há sim uma evolução acontecendo historicamente no TEA. Isso inclui a busca por compreender suas causas. Aliás, conhecê-las é fundamental para entender se o autismo é genético. Continue lendo que iremos explicar a seguir.
Causas para o Transtorno do Espectro Autista
Pesquisadores ainda buscam elucidar a causa do autismo; todavia, nas últimas décadas, algumas etiologias foram propostas e parecem incluir causas metabólicas, hormonais, imunológicas, neuroanatômicas, neurofisiológicas e, principalmente, genéticas para o TEA. Conhecer a base genética do transtorno auxilia tanto no diagnóstico, quanto no seguimento desses pacientes.
Entretanto, existem também outras situações que podem estar relacionadas com as causas do autismo, sendo as mais conhecidas:
- Idade avançada dos pais;
- Complicações gestacionais e perinatais (síndrome metabólica materna, pré-eclâmpsia, hipoglicemia neonatal, prematuridade);
- Tempo entre as gestações inferior a 1 ano;
- Síndrome do X frágil;
- Exposição fetal a fármacos como ácido valpróico e talidomida, dentre outras.
Afinal, o autismo é genético?
A hipótese de características genéticas para o TEA ganhou força quando o primeiro estudo com gêmeos autistas conduzido por Folstein e Rutter em 1977 mostrou que, claramente, há uma contribuição genética para o transtorno. Desde então, diversos estudos genéticos foram conduzidos e, atualmente, mais de 1.000 genes possivelmente envolvidos na causa do autismo foram identificados.
Ainda nesse contexto, acredita-se que o TEA seja uma das principais condições com características hereditárias, havendo pesquisas que estimam uma herdabilidade superior a 90%. Isso auxilia a compreensão de porque se deve investigar familiares próximos ao ter um membro diagnosticado com TEA.
Um grande estudo com mais de dois milhões de participantes de cinco países diferentes publicado em 2019 para tentar identificar se o autismo é genético afirmou que 97% a 99% dos casos de autismo têm sim essa causa, sendo 81% deles hereditários. A pesquisa sugere ainda que de 18% a 20% dos casos têm causa genética não hereditária, ou seja, não herdada dos pais. Já o restante, aproximadamente de 1% a 3%, deve ter causas ambientais, como as citadas anteriormente em nosso texto.
No texto de hoje, fizemos um breve resumo sobre o contexto histórico do TEA e explicamos que existem diversas possíveis causas para o autismo. Todavia, a que parece ter maior relevância e confiabilidade é a genética. Assim, embora não possamos dizer unicamente que o autismo é genético, sabemos que sua base parece estar ligada fortemente a isso. Tendo esse conhecimento, percebemos que é extremamente relevante buscar por possíveis diagnósticos em famílias que possuem algum membro afetado.
E você, conhece alguém que possua mais de um membro na família com o Transtorno do Espectro Autista? Já fez algum teste genético para essa condição? Conte para nós nos comentários!
Dr. Matheus Trilico é neurologista referência no diagnóstico e acompanhamento de TEA e TDAH em adultos. Formado em medicina pela Faculdade Estadual de Medicina de Marília (FAMEMA) e com residência em Neurologia pelo Hospital de Clínicas da Universidade Federal do Paraná (HC-UFPR) e mestre também pela UFPR. Além de atuar como neurologista em consultório privado e no Sistema Único de Saúde (SUS), realiza também atividades acadêmicas. Dr. Matheus Trilico acredita que o ser humano precisa conhecer bem sua saúde e, por isso, transmite as informações sobre o quadro clínico de forma clara e didática, reafirmando seu compromisso com a exímia relação médico-paciente. Amante da tecnologia, busca utilizá-la para agregar conhecimento e facilitar a vida dos pacientes, mas sem perder seu foco: o humanismo e a qualidade do atendimento médico.
CRM 35.805/PR – RQE 24.818